Dirigir em países de mão inglesa como a Irlanda, a Escócia, a Inglaterra, a Indonésia, a Jamaica e o Japão não é exatamente conduzir na contramão, como diz o título. Mas, durante um tempo, é exatamente assim que a gente se sente. Para muitos motoristas experientes, conduzir um carro é quase que automático, como uma dança. É movimentar os pés e as mãos sem nem pensar. É instintivo, ensaiado e é decorado. Porém, ao cruzar algumas fronteiras, a regra muda. E não só ela. Afinal, você não apenas conduz do lado esquerdo da rua como o seu volante vai lá para a direita do automóvel. O lado bom? Seu cérebro acostuma rapidinho à nova realidade.
Pois é, voyajante, essa introdução bem mais ou menos não tem como objetivo desencorajar você a dirigir em países de mão inglesa. Muito pelo contrário. Afinal, não são todos os destinos que uma excursão ou o transporte público resolvem, infelizmente. Alugar carro aqui na Irlanda ou no Reino Unido pode, muitas vezes, ter o melhor custo-benefício e eu não estou falando apenas do investimento monetário. A gente já discutiu em diferentes momentos aqui que tempo é dinheiro. Viajar de carro dá a você uma liberdade que um ônibus ou um trem não dão. Afinal, quando você não está em grupo, cabe apenas a você mesmo o quanto de tempo você vai investir em cada local ou atração.
E o quão poderoso é isso?
Quais países usam a mão inglesa?
São mais de 50 países no mundo que utilizam a mão inglesa hoje em dia e, sim, muitos deles são ex-colônicas britânicas. Logo é compreensível que façam o uso desse sistema de direção em seus territórios – exemplos são a Irlanda, a Índia, a Austrália, a Nova Zelândia e a África do Sul. Mas, não podemos generalizar. Nunca é bom, não é mesmo? E aqui não seria diferente. O Japão, que não foi colonizado pelos ingleses, é bom ressaltar, faz parte desse seleto grupo. Há quem diga que a mão oposta japonesa tem origem nos samurais e nas suas espadas. Mas há aqueles que afirmam que o país adotou a mão inglesa após a visita de políticos britânicos na ilha.
Ah, e os Estados Unidos? Eles foram colônia britânica e dirigem na direita! Verdade, voyajante. E eles até usaram a mão inglesa durante um tempo na América. Mas, quando eles proclamaram a independência, eles proclamaram a independência. Não queriam mais qualquer vínculo ou herança com a Inglaterra. E se isso quer dizer trocar o sentido da direção do país, que assim seja.
De onde surgiu a mão inglesa?
E senta que lá vem história. Você não achou que eu escreveria sobre como é dirigir em países de mão inglesa sem tentar explicar a origem desse sistema de direção, não é mesmo? Pois bem. Tudo começou lá com o Império Romano (e sim, sempre ele). Reza a lenda que os soldados, ao segurarem suas armas com a mão direita, locomoviam-se pela esquerda nas estradas. Desta forma eles estavam sempre “livres” e com as mãos desimpedidas para um embate. Com o passar do tempo, o mesmo pensamento se aplicava aos condutores de carruagens e aos cavaleiros montados. As rédeas ficavam seguras nas mãos esquerdas e os chicotes e/ou armas nas direitas.
Mas você deve estar se perguntando agora: e o que mudou? Porque grande parte do mundo decidiu adotar o oposto da mão inglesa se esta nasceu a partir do Império Romano. Eu conto a você, voyajante, e é bem simples: Revolução Francesa. Quando a monarquia foi guilhotinada, a França mandou uma mensagem. Quando Napoleão Bonaparte se auto proclamou rei, a França mandou uma mensagem. E não é à toa que muitos países, em todos os continentes do mundo, seguiram-na. O imperador francês era canhoto, então tudo que fazia sentido para os soldados romanos e para os cavaleiros ingleses não fazia sentido para Napoleão. Por que não mudar?
Daí nasceu a mão francesa. Que é a mão que a gente usa no Brasil.
É preciso algum tipo de documento especial para dirigir na mão inglesa?
Se você for visitar a Irlanda ou algum país do Reino Unido por motivos de turismo, a resposta é não, você não precisa de um documento especial para dirigir na mão inglesa. Grande parte das locadoras de carro aceitam a CNH brasileira – mas sempre é bom dar aquela checada antes do embarque, já que as regras podem mudar. Países como a Austrália e a Nova Zelândia, por sua vez, pedem a chamada PID – Permissão Internacional de Direção. Então não deixe para fazer a sua em cima da hora, já que demora um tempinho para ficar pronta.
E onde faz? No Detran do Estado onde você mora – e cada um tem suas próprias regras. Em São Paulo, por exemplo, nós solicitamos no Poupatempo. Mas também é possível fazer pela internet. A PID tem validade igual da carteira de motorista, então se você tirar a sua faltando, sei lá, dois anos para expirar a sua habilitação, a sua PID só valerá dois anos. Ah! E é bom dizer que a PID não substitui a CNH, viu? Tem que andar com os dois documentos. E, sinceramente? É um bom investimento. Por mais que grande parte das locadoras europeias não solicitem um para te dar o carro, você sempre pode ser parada pelas autoridades locais rodoviárias e é muito mais fácil para eles ter a PID em mãos do que tentar decifrar a CNH, não é mesmo?
4 dicas para dirigir na mão inglesa
Sempre esquerda!
Essa é a dica de ouro segundo o @gianmattos. É a número 1, 2 e 3 no top 3 dele de dicas para dirigir na mão inglesa. Uma vez que você entende, assimila e incorpora que você deve se manter à esquerda, tudo fica mais fácil.
Embora eu esteja escrevendo e assinando esta matéria, devo dizer, voyajante, que eu não sou a pilota do núcleo Irlanda do blog. Esta posição é ocupada pelo Gian – aqui no núcleo Dublin – e a sabedoria aqui compartilhada vem diretamente dele. Eu sou apenas a mensageira. Mas, devo dizer que, para esta que vos escreve, as curvas na mão inglesa são os momentos onde o cérebro dá mais pane, curto-circuito, tilt. Não foram poucas as vezes em que eu me assustei sozinha – e com isso assustei o motorista em questão, quase sendo convidada a descer do veículo ou a me sentar no banco traseiro – achando que o carro estava entrando na contramão.
Atente-se à marcha
Enquanto o volante e todos os botões e alavancas que o cercam mudam para o lado direito do carro, o câmbio continua no mesmo lugar. Ele não só continua no mesmo lugar como as marchas continuam nas mesmas posições. Então com o seu braço esquerdo você vai colocar na primeira empurrando o câmbio lá para a esquerda e para cima. A marcha mais perto de você é a quarta e a quinta. E não é que é ao contrário, percebe? É a mesma marcha. É você que está sentado do lado diferente dela.
Existem pessoas que optam alugar carros automáticos para evitarem a confusão com a marcha. É uma opção? Sim. A cada dia que passa existem mais carros automáticos na oferta das locadoras e em um futuro próximo, isso não estará nem mais em discussão. Mas, por enquanto, é bom ressaltar que filtrar por um carro automático pode, em alguns países, limitar bastante a sua busca. Ou ainda impactar no preço final.
Ah! E da mesma forma que o câmbio não muda de lugar e ordem, os pedais também não. Quer dizer, ele também vai para o lado direito do carro, mas ele segue a mesma ordem de embreagem, freio e acelerador, da esquerda para a direita.
Ps.: Nos carros que alugarmos aqui na Irlanda e no Reino Unido – Escócia, Inglaterra, Irlanda do Norte e País de Gales – as alavancas de setas, faróis e limpadores estavam nas mesmas posições que conhecíamos e usávamos no Brasil. Mas, porém, entretanto, todavia, li muitos posts e matérias de pessoas que pegaram carros onde esses botões eram também trocados. Então fica a dica e dá aquela testada boa assim que entrar no carro pela primeira vez, e evitar surpresas quando estiver dirigindo por aí. Combinado?
Ultrapasse pela direita
Sabe a regra do mantenha-se à esquerda? Pois bem, ela vale aqui também. Em rodovias, a faixa da esquerda é a faixa “lenta” e a faixa da direita é a “rápida”. Aqui na Irlanda, por exemplo, a faixa da direita é faixa de ultrapassagem. Você transita pela faixa da esquerda em rodovias e só vai para a da direita para ultrapassar o carro à sua frente. Depois, você volta para o seu lugar. Mas aí entramos nas especificidades dos países e esse não é o objetivo deste post. Afinal, seria muita presunção da minha parte querer que todos os países possuam regras de trânsito parecidas.
Sempre dirija com um GPS (e não esqueça o carregador!)
Não interessa se você é adepto ao Waze ou ao Google Maps, o uso de um bom GPS é imprescindível em qualquer país, seja ele com ou sem a mão inglesa. Quando não conhecemos o lugar onde estavamos ou o carro em que estamos dirigindo, não precisar se preocupar com o caminho e/ou o trânsito é um super bônus, então deixe os robôs trabalharem para você nisso.
E é sempre bom porque você consegue ter um panorama do que espera você lá na frente. Se você está a muito tempo na estrada, principalmente com carros automáticos, você tende a esquecer que está em uma mão contrária da qual está habituado. O cérebro pode ter um tempo de reação menor quando ver placas de saída. Logo, mantenha o GPS ligado e ele já vai avisando você em qual faixa ficar, se você vai entrar ou não na próxima rotatória e assim por diante. Ah! E não esqueça de baixar o mapa do país onde você visitará para ter acesso offline. E já que está com o celular em mãos, que tal seguir a gente no Instagram?
Bônus: como é andar em países de mão inglesa?
E quando eu falo em andar aqui, voyajante, eu estou falando de dar passos, caminhar. Colocar as suas pernas para jogo. Muitas vezes nós ficamos muito impactados pela ideia de dirigir em países de mão inglesa que esquecemos que os pedestres também são afetados pelo sentido das vias quando vão atravessar a rua. Aqui em Dublin, na Irlanda, todas as faixas de pedestre possuem sinalizações do tipo “look right” (olhe para a direita) ou “look left” (olhe para a esquerda) para os turistas e/ou imigrantes não serem atropelados. Nos meus primeiros meses morando fora, ou eu girava a minha cabeça 360º igual a menina do Exorcista, ou eu rodopiava que nem uma bailarina até chegar na outra calçada para poder ter uma visão dos dois sentidos e chegar em segurança.
E hoje eu faço o mesmo quando vou visitar a @jenifercarpani em Milão ou quando eu estou no Brasil. Minha mãe me segurou várias vezes pelo braço quando eu ia atravessar a rua e estava erroneamente olhando para o lado contrário. Por isso hoje eu sou muito mais adepta a atravessar nas faixas de segurança onde tem farol de pedestres. Pois é, eu não confio mais em mim mesma para atravessar despretensiosamente a rua em nenhum lugar no mundo, hahahahaha.
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