Como é um intercâmbio universitário nos Estados Unidos?

Como o próprio site descreve, o Ciência Sem Fronteiras foi um programa dos Ministérios da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e do Ministério da Educação (MEC) que buscava “promover a consolidação, expansão e internacionalização da ciência e tecnologia, da inovação e da competitividade brasileira por meio do intercâmbio e da mobilidade internacional”. Foi? Buscava? Isso mesmo. Infelizmente, o programa foi cortado em 2017 devido a falta de dinheiro.

Mas Rafael Soler foi um dos alunos participaram do Ciência Sem Fronteiras na modalidade Graduação Sanduíche e passou 18 meses na SUNY Plattsburgh em Nova Iorque, nos Estados Unidos. Sanduíche? Sim, é o nome que se usa para um curso universitário onde se tem a oportunidade de passar um tempo estudando em uma instituição estrangeira. Confira abaixo como foi a experiência dele neste tipo de intercâmbio.

Como expliquei neste post aqui, a #serieintercambio tem como objetivo compartilhar pela perspectiva dos próprios intercambistas como foi a experiência de estudar e morar fora de seu país de origem.

Esse é o Rafael com sua “mãe americana” de raízes irlandesas comemorando o St. Patrick’s Day

– Como foi no início?
Tenso. Não dominava o idioma e o primeiro semestre seria com foco em desenvolvimento da língua. Quem me conhece sabe que sou extrovertido e muito comunicador, mas o medo de ser mal interpretado ou virar a chacota de estrangeiros me deixou preso nos primeiros meses. Meu grupo tinha 12 brasileiros na mesma situação. Por causa do contexto ficamos muito unidos, como uma maneira de nos proteger acredito. Éramos conhecidos pelos professores como a Brazilian Bubble. Por um lado era bom, mas era a zona de conforto. Entre nós era natural que não falássemos inglês ou déssemos abertura para americanos participarem e nos apresentarem sua cultura. Olhando pra trás eu diria que foi um “tempo perdido”. Meu intercâmbio tinha data de volta e “gastei” alguns meses com medo de falar algo errado ou não entender direito o que me falavam. Posso dizer que depois de tomar coragem de romper essa bolha, de participar dos clubes da universidade e levantar a mão em sala pra perguntar algo é que passei a entrar na zona de aprendizagem. Aí meu intercâmbio começou a valer a pena.

– Como foram as aulas, o curso que fez?
Como comentei, meu primeiro semestre era focado no aperfeiçoamento do idioma. Na universidade eles tinham o programa de ESL – English as a Second Language – direcionado a alunos estrangeiros. De gramática à fonoaudiologia, o foco era sair fluente no inglês. Ou pelo menos o suficiente pra sobreviver às aulas da universidade haha.

Nos 2 semestres seguintes escolhi disciplinas que gostaria de fazer dentro do meu major (quase o equivalente ao nosso modelo de ensino, onde você escolhe um curso de graduação). No meu caso foi um pouco complicado porque no Brasil meu curso é híbrido, era uma mistura de Sistemas da Informação e Comunicação Digital. Eles não tinham algo com a grade curricular completa igual, então escolhi disciplinas entre os cursos de Design Digital, Jornalismo e Ciência da Computação.

Em geral optei por disciplinas que fossem complementares as minhas áreas de conhecimento e não necessariamente para “aproveitar” créditos quando voltasse ao Brasil. Mas também fiz disciplinas que se diziam avançadas, para alunos no último ano da faculdade, e que no final acabaram sendo básicas, assuntos que já tinha visto antes na UFC. E aqui pra mim foi o maior diferencial e gratidão pela minha universidade pública.

Aprendi coisas novas importantes pra minha formação profissional? Sem sombra de dúvidas. Mas achei o nível de conhecimento das disciplinas, do que era passado e cobrado pelos professores muito abaixo da média. Aqui acho que tem aquela de síndrome de vira lata do brasileiro, que vai para os States com aquela impressão de que tudo é muito melhor do que tinha aqui. E não era. O nível de ensino avançado, a inovação do meu curso em ser diferente em universidade pública, meus professores com nível de exigência e qualidade no que fazíamos é que elevou a régua para o profissional que sou hoje. (Militei. Sorry hehe)

Mas voltando… fora essa “decepção” com o nível de ensino (algo que já tinha escutado dos outros brasileiros que vinham de graduações em química, biologia e biotecnologia), era inegável os recursos disponíveis na universidade. E para quem vem de uma formação onde a tecnologia é base, ter terceiros, os equipamentos necessários para você aprender bem foi uma experiência única. Isso tanto pra mim quanto para os colegas brasileiros que tinha laboratórios avançados e poderiam continuar sua pesquisas com maior qualidade e efetividade.

No resumo: não tive um nível de ensino tão AAA como eu imaginava, mas o que eu já tinha aprendido no Brasil aliado aos recursos disponíveis me fez testar e experimentar muita coisa que talvez eu não conseguisse aqui.

“Um cearense vendo neve pela primeira vez”

Qual foi o momento mais desafiador que passou durante o intercâmbio?
A primeira fase de adaptação, sair da zona de conforto que me coloquei e descrevi acima. Hoje posso dizer que me “jogo” sem medo ao falar ou interagir quando viajo para outros países por essa experiência que vivi.

Depois dessa coragem libertadora, ganhando mais visibilidade na universidade, fui convidado para ser monitor de 2 disciplinas. Esse momento foi preocupante. Não era mais questão de entender o que falava e trocar uma ideia de corredor. Eu precisaria transmitir conhecimento para alunos americanos. Imagina fazer isso sem dominar o idioma tão fluente? Bom, encontro meus meios através de mapas mentais, dinâmicas e afins para poder ser efetivo de fato. Até hoje não recebi nenhum feedback negativo dessa experiência haha.

E claro, tem aqueles momentos que envolvem as viagens que você faz para curtir ou conhecer mais a cultura do país. Tem coisas que nem vale entrar em detalhes, mas Vegas tem história. Fica difícil lutar contra estereótipo de brasileiro quando a gente anda com um monte deles que gosta de fazer loucuras por aí. Haha

Qual foi o melhor momento que você passou durante o intercâmbio?
Tem vários, mas o ponto em comum era o de conhecer pessoas, mais especificamente suas história, sua maneira de ver o mundo e a partir de outras lentes você descobrir que sua visão era tão limitada. Puutz, isso é sensacional. E diria que até hoje tenho sede disso, de ouvir histórias e reaprender a enxergar as coisas.
Pra citar momentos, as universidades americanas tem a cultura de Clubs muito forte. Tinha de tudo, do xadrez ao ukulele. E claro, tinha o Club International no qual tive o prazer de ser o presidente por um período e poder desenvolver iniciativas que promovessem uma cultura empática com alunos estrangeiros. Teve uma ação que envolvia arrecadar fundos para um hospital de crianças com câncer. Para isso os clubs formavam grupos em que ficavam 24h acordados fazendo vários desafios e arrecadando doações. O ato de você ter que atuar em conjunto com diferentes amigos dos mais diversos países por um objetivo em comum e importante era revigorante. Talvez se traduzindo no que no inglês se entende por Serendipity.

Aqui, Rafael na ação social promovida pelo club internacional com amigos de diferentes países

Que dicas daria para quem pensa em fazer um intercâmbio similar ao seu?
Vá. Com medo ou sem medo, só vá. Evite os “e se…”. A gente se auto sabota em tudo e acaba procurando “o momento certo”, ou “quando eu juntar mais grana”, ou “quando eu falar melhor inglês” e por aí vai.

A principal dica é sempre dar o primeiro passo. O primeiro passo em ir; primeiro passo em falar sem medo de dizer algo errado; primeiro passo pra perguntar sobre o motivo de agirem assim porque no seu país é diferente; o primeiro passo de abrir a mente e estar disposto a enxergar o mundo sob outra perspectiva.

Você passaria por essa experiência novamente? Ou faria outro intercâmbio?
Sem sombra de dúvidas. Até hoje acompanho muitos blogs e venho estudando outros formatos de intercâmbio.

Se você fosse dar uma dica para você mesma quando decidiu fazer o intercâmbio, qual seria?
Aproveite mais cada momento que teve oportunidade de conversar com alguém, de entender e conhecer mais sobre ele. Esses momentos são enriquecedores e são neles que que você carrega aprendizados pra vida.

Mais alguma informação sobre que gostaria de acrescentar?
Acho que já falei de mais hahaha. Vou deixar a curiosidade no ar para mais informações.

“Dos pequenos momentos de vivenciar a cultura americana. Halloween é algo realmente sério pra eles”.

E aí, ficou curiosx? Quer mais informações do Rafael? Entre em contato com a gente! E vale ressaltar que existem várias instituições brasileiras com convênios com universidades no exterior que possibilitam a Graduação Sanduíche. Super legal, né?

Rafael, muito obrigada por participar da nossa #serieintercambio e compartilhar com a gente sua experiência nos Estados Unidos. De coração, gratidão!

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